Ser atriz é conviver com o mundo
estando fora dele
observar o tempo passar
fingindo o triste esquecimento
ser atriz é abraçar o mundo
quando não se tem fé no alheio sentimento
(ainda por ternura, ainda por amor)
ser atriz é decorar o texto sem sentido
roto e repetido
o texto que não fala ao coração
o texto que não consola
o texto de um autor
há muito fora de moda
ser atriz é subir ao procênio sem platéia
sem riso e sem aplauso
encenando a loucura do próprio gênio
(por si, para si)
ser atriz é desejar todas as almas do mundo
com suas máscaras
e dramas e comédias
e posição em cena
por desejo de tornar-se
sem jamais realmente poder vir a ser
ser atriz é conviver com fantasmas
que lhe contam coisas ao longo dos atos da vida
sempre anotando tudo
sempre aclarando a memória
que acaba por se tornar outra coisa
ser atriz é,
ouvir,
para não esquecer
para representar
no imaginário e fantasia
aquilo que não poderia ser a realidade
(mas é)
ser atriz é ver a cortina se encerrar
para no palco se sentar
e indefinidamente aguardar
o verdadeiro espetáculo
da vida
que a de começar
que a de começar
que a de começar!
(Bêbada e louca, como poucos!)